sexta-feira

Sensação do espaço e do tempo

Os cortinados daquela janela, apesar de compridos, estão curtos, não chegam ao chão. Parece que têm a saia arregaçada. Como eu quando, contigo e as tuas calças arregaçadas também, saltava por cima das pedras escorregadias, verdes, brilhantes de musgo e algas e vida. Para atravessar até à outra margem. Quando perdi o equilíbrio caí e levei-te comigo, mãos dadas. A saia que se enrolava em mim e em ti molhada e as voltas que dávamos em torno de nós. Eram as voltas que os cortinados davam em nossa volta. Perdidos pelo chão, encontrámo-nos e perdemo-nos um ao outro. Ficámos tantas vezes deitados, calados, olhos no céu. Muitas vezes a sensação de se estar próximo é mais forte quando se está longe. Quando se está perto, a proximidade perde-se, é tão fácil tocar-se e ver-se e ouvir-se e cheirar. A facilidade torna tudo isto menos valioso. A distância aumenta a vontade de retornar, de correr, de ter. Como o potencial electroquímico na origem dos processos fisiológicos na base do desenrolar da vida dos corpos. É a distância que nos faz querer tomar os corpos dos outros nos nossos braços. Uma vez nos nossos braços, parece não ter tanta importância o tempo que neles ficam. É sempre mais importante que fiquem mais tempo, quando esse tempo não está a acontecer agora. Eu, porém, mal te toco, já está a minha ideia na ideia de estares a descer no elevador, com a mochila às costas e com a cabeça no que vais fazer a seguir. Mal te tenho, no instante imediatamente seguinte para mim já estás a partir, já me sinto longe outra vez e ainda não me deixaste. Antecipo o último beijo, desde o primeiro que me dás. Vai, vai embora. Vai, que um dia vai parecer que nunca vieste. Vai parecer que nunca aqui estiveste. Se esse dia for tão doloroso como pressinto…

1 comentário:

Zé Pedro disse...

;'(