segunda-feira

Chá de domingo

A luz branca quente que entrava através dos velhos cortinados da sala produzia sombras compridas e esguias, delineava as cadeiras e os sofás, e as pessoas. As pessoas falavam alto, riam gargalhadas abertas e sonoras, bebiam chá de erva-cidreira acompanhado de bolinhos, biscoitos e bolachas acabados de sair do forno. Uma pessoa fumava, e enchia a casa escadas acima de fumo e cheiro a tabaco, usava o cinzeiro que permanecia limpo todos os dias da semana excepto o domingo. Não me lembro de que falavam. Imagino que fossem assuntos de política tanto como o último rebento de alguém, doenças e saúdes, trabalho e festas de aniversário. As colheres batiam nas chávenas do serviço da Vista Alegre e eu ouvia o retinir a partir do meu quarto. Hoje está tudo guardado, provavelmente a precisar que lhe limpem o pó. O serviço, o chá, os bolos, as pessoas. O tempo perdeu o fulgor que teve outrora. Já não ouço nada do meu quarto a não ser as vozes que saem da caixa da televisão. Enchem o espaço que antes nunca estava vazio. E o chá representa já algo diferente. Menos doce.