sábado

Da varanda, o Equador

O laguinho no quintal abunda em vida verde, castanha, lodosa, gelatinosa. Alberga pequenas e grandes rãs que ao anoitecer coacham cantos que embalam o meigo balançar dos longos, esguios ramos do chorão a roçar viçosas ervas no chão. Sentada na espreguiçadeira de madeira esburacada pelo bicho e de branco pano manchado pelo amarelo do tempo, contemplo o espectáculo, ambientado pela brisa do fim de dia. Contagia-me a calma do céu primaveril. Perturbada nem pelas andorinhas em pique, nem pelo restolhar das folhas das árvores ao levantar do vento, suave. Cai um limão da sua árvore. Passa uma lagartixa cheia de pressa. Lá dentro, vozes de quem conta histórias de tempos antigos, não tão distantes assim. Caminhos de roça em roça, cor das peles, café, cacau e banana. O peixe e a água quente a banhar o areal. E o verde, sempre verde do mato e de todas as coisas. As geringonças que os miúdos arranjavam como brinquedos. Os jogos à bola. As viagens diárias para a escola, em jipes metálicos que saltavam todo o caminho. Tudo diluído por fim em medo e destruição. Uma quase fuga, oportuna. E saudades. Alguma vontade de voltar. Mas para ver o que já não existe. O que foi entretanto tão maltratado. O que já está só na memória de quem lá esteve. "Quando o último branco se for embora, São Tomé acaba", alguém disse.